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Uso do solo urbano, especulação, risco e exclusão.

Atribui-se a Confúcio a afirmação que existem quatro formas de aprender: a repetição, o trauma, o trauma da repetição e a repetição do trauma. Creio que em matéria de desastres urbanos nenhuma nos serviu até agora.

Teremos que inventar uma quinta? Bem, depende.
Ocorre que a cidade é talvez o produto mais complexo que a humanidade já produziu. São milhares de produtores e milhões de consumidores. A possibilidade de defeitos cresce na razão direta do numero de pessoas envolvidas, dizem os especialistas. Se, no processo de produção e consumo prevalecer o espontâneo, então nem se fala. Mas, dois fatores contribuem decisivamente para este crescimento desordenado e perigoso das cidades: a propriedade privada da terra, e a enorme pobreza que tem como epicentro os centros urbanos, mas se espalha por todo país.
As cidades crescem. Especialmente as situadas debaixo da linha do Equador. A demanda por espaço idem, idem. A terra urbana melhor localizada pressionada avisa: aqui só pagando mais! Os donos enriquecem sem fazer força. Enriquecem, sem justa causa. Os pobres são excluídos e sem outro remédio se instalam em áreas mais distantes e/ou em pirambeiras onde nem o bode se aventura. Correm grandes riscos, especialmente quando os temporais dissolvem os morros e inundam o que antes eram várzeas. A enxurrada frequentemente leva seus bens, quando não sua própria vida. Mas, perdem também por outras razões: gastam mais tempo e dinheiro no transporte, pois moram mais longe de seus empregos e dos serviços públicos.
Soluções? Existem.
O planejamento com o uso dos instrumentos do Estatuto da Cidade pode ajudar a evitar que a situação se agrave. Sem influir diretamente na melhoria da renda das camadas mais pobres, possui instrumentos para quebrar o círculo infernal: terrenos mais caros, exclusão dos mais pobres, ocupação de áreas de risco e tragédias anunciadas. Citarei apenas um deles: as ZEIS, zonas especiais de interesse social. Nestas zonas devem prevalecer as habitações de interesse social, isto é, as moradias para os pobres. Basta que o Plano Diretor declare uma determinada área como Zeis que a especulação ou a engorda sofrem ali um considerável golpe. Se esta área estiver bem localizada e em lugar seguro é uma garantia para que as famílias mais pobres ganhem uma importante linha de resistência contra a expulsão rumo a periferia e ao abandono maior.
Mas é preciso coragem e vontade política para fazê-lo. Muita gente poderosa será contrariada. Não por outra razão a conspiração contra as Zeis é permanente. O Plano Diretor Estratégico de São Paulo (2002) possui mais de 900 Zeis ocupando um espaço equivalente a 32 km2. A maioria são áreas de periferia ou onde já existem favelas. Mas algumas estão excepcionalmente bem localizadas. Dois exemplos: cercada por edificações das mais modernas e luxuosas da Avenida Faria Lima encontra-se a pequena favela Coliseu-Funchal. De um lado o moderníssimo E-Tower ( na inauguração a foto publicitária eliminou a favela por computação gráfica transformando-a em estacionamento…) do outro o elegante Centro Empresarial Milenium e, cortando o acesso à marginal Pinheiros, a impoluta ex-Daslu. A outra é a favela Jardim Edith ao lado da Ponte Estaiada ( novo cartão postal da cidade) e lindeira à Av. Berrini. Na inauguração da ponte as autoridades do governo municipal quiseram removê-la enviando as famílias moradoras para bem longe. Mas por intervenção do Ministério Público, da Defensoria Publica de forças sociais defensoras do direito de moradia, e especialmente da organização social deles próprios, não foram removidos. Houve um acordo para a construção de cerca de 250 moradias para os favelados. Aliás, a arrecadação originada na venda dos primeiros Cepacs da Operação Água Espraiada – que começaram a ser vendidos em 2004 – eram destinados à Ponte Estaiada e a urbanização da favela. A ponte foi terminada mas a favela não.
Agora esta sendo. Os apartamentos de 50 m2 já estão quase prontos (dez.2012) acompanhado de creche, posto de saúde, área ajardinada e uma escola de gastronomia ao custo de 25 milhordes de reais. A favela Coliseu continua a espera de solução. Dinheiro não falta, pois na Faria Lima já foram arrecadados ( 2012) mais de 2 bilhões de reais em Cepacs e outorga onerosa.
Vivendo em mansões suspensas com varandas gourmets de mais de 100 m2, os ricos alegam que a proximidade dos pobres desvaloriza seus imóveis. Não percebem que enviá-los para a periferia desvaloriza a cidade como um todo e torna a vida social insustentável. O princípio constitucional da função social da propriedade urbana deveria ser o ponto de referencia quando se pensa em soluções para as tragédias urbanas. Ah! já ia me esquecendo, o Art. 3 inciso III de nossa lei maior reza: ” erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais”.

Atribui-se a Confúcio a afirmação que existem quatro formas de aprender: a repetição, o trauma, o trauma da repetição e a repetição do trauma. Creio que em matéria de desastres urbanos nenhuma nos serviu até agora.
Teremos que inventar uma quinta? Bem, depende.

Ocorre que a cidade é talvez o produto mais complexo que a humanidade já produziu. São milhares de produtores e milhões de consumidores. A possibilidade de defeitos cresce na razão direta do numero de pessoas envolvidas, dizem os especialistas. Se, no processo de produção e consumo prevalecer o espontâneo, então nem se fala. Mas, dois fatores contribuem decisivamente para este crescimento desordenado e perigoso das cidades: a propriedade privada da terra, e a enorme pobreza que tem como epicentro os centros urbanos, mas se espalha por todo país.

As cidades crescem. Especialmente as situadas debaixo da linha do Equador. A demanda por espaço idem, idem. A terra urbana melhor localizada pressionada avisa: aqui só pagando mais! Os donos enriquecem sem fazer força. Enriquecem, sem justa causa. Os pobres são excluídos e sem outro remédio se instalam em áreas mais distantes e/ou em pirambeiras onde nem o bode se aventura. Correm grandes riscos, especialmente quando os temporais dissolvem os morros e inundam o que antes eram várzeas. A enxurrada frequentemente leva seus bens, quando não sua própria vida. Mas, perdem também por outras razões: gastam mais tempo e dinheiro no transporte, pois moram mais longe de seus empregos e dos serviços públicos.

Soluções? Existem.

O planejamento com o uso dos instrumentos do Estatuto da Cidade pode ajudar a evitar que a situação se agrave. Sem influir diretamente na melhoria da renda das camadas mais pobres, possui instrumentos para quebrar o círculo infernal: terrenos mais caros, exclusão dos mais pobres, ocupação de áreas de risco e tragédias anunciadas. Citarei apenas um deles: as ZEIS, zonas especiais de interesse social. Nestas zonas devem prevalecer as habitações de interesse social, isto é, as moradias para os pobres. Basta que o Plano Diretor declare uma determinada área como Zeis que a especulação ou a engorda sofrem ali um considerável golpe. Se esta área estiver bem localizada e em lugar seguro é uma garantia para que as famílias mais pobres ganhem uma importante linha de resistência contra a expulsão rumo a periferia e ao abandono maior.

Mas é preciso coragem e vontade política para fazê-lo. Muita gente poderosa será contrariada. Não por outra razão a conspiração contra as Zeis é permanente. O Plano Diretor Estratégico de São Paulo (2002) possui mais de 900 Zeis ocupando um espaço equivalente a 32 km2. A maioria são áreas de periferia ou onde já existem favelas. Mas algumas estão excepcionalmente bem localizadas. Dois exemplos: cercada por edificações das mais modernas e luxuosas da Avenida Faria Lima encontra-se a pequena favela Coliseu-Funchal. De um lado o moderníssimo E-Tower ( na inauguração a foto publicitária eliminou a favela por computação gráfica transformando-a em estacionamento…) do outro o elegante Centro Empresarial Milenium e, cortando o acesso à marginal Pinheiros, a impoluta ex-Daslu. A outra é a favela Jardim Edith ao lado da Ponte Estaiada ( novo cartão postal da cidade) e lindeira à Av. Berrini. Na inauguração da ponte as autoridades do governo municipal quiseram removê-la enviando as famílias moradoras para bem longe. Mas por intervenção do Ministério Público, da Defensoria Publica de forças sociais defensoras do direito de moradia, e especialmente da organização social deles próprios, não foram removidos. Houve um acordo para a construção de cerca de 250 moradias para os favelados. Aliás, a arrecadação originada na venda dos primeiros Cepacs da Operação Água Espraiada – que começaram a ser vendidos em 2004 – eram destinados à Ponte Estaiada e a urbanização da favela. A ponte foi terminada mas a favela não.

Agora esta sendo. Os apartamentos de 50 m2 já estão quase prontos (dez.2012) acompanhado de creche, posto de saúde, área ajardinada e uma escola de gastronomia ao custo de 25 milhordes de reais. A favela Coliseu continua a espera de solução. Dinheiro não falta, pois na Faria Lima já foram arrecadados ( 2012) mais de 2 bilhões de reais em Cepacs e outorga onerosa.

Vivendo em mansões suspensas com varandas gourmets de mais de 100 m2, os ricos alegam que a proximidade dos pobres desvaloriza seus imóveis. Não percebem que enviá-los para a periferia desvaloriza a cidade como um todo e torna a vida social insustentável. O princípio constitucional da função social da propriedade urbana deveria ser o ponto de referencia quando se pensa em soluções para as tragédias urbanas. Ah! já ia me esquecendo, o Art. 3 inciso III de nossa lei maior reza: ” erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais”.

1 comentário

  1. Paulo Sandroni

    Estimado Walter,

    Em minha palestra enfatizei que a mudanca de uso ( rural para urbano) deveria ser feita com o cuidado de impedir que a extraordinaria valorizacão da terra fosse apropriada exclusivamente pelo proprietario ( que nada fez para esta valorizacão). Se a expansao urbana alcanca areas que antes eram rurais a legislacao correspondente deve traze mecanismos para capaturar este valor por parte do setor publico. Uma das formas e reduzir a coeficiente de aproveitamento a 0,5 e fixar uma maximo digamos de 4. Se o proprietario/empreendedor quiser construir usado coef. 4 tera que pagar pela diferenca ( 4,0 – 0,5 = 3,5). Este processo denomina-se outorga onerosa e no blog tenho um texto sobre isto que esta na seccão Urban Development Papers.

    Saudacões

    Paulo Sandroni

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