Um economista desencantado poderia criar o conceito que encabeça este artigo:
“Política econômica exitosa para enfrentar conjuntura adversa, mas que provoca consequências desastrosas se mantida indefinidamente. Estímulos ao consumo como subsídios tarifários, creditícios, tributários e aumentos salariais foram eficazes para enfrentar a crise em 2008/9.”
Mantidos depois de 2010, no entanto, corroeram as contas públicas, despertaram o dragão inflacionário, incharam a dívida pública e aguçaram a desconfiança dos empresários. Estes brecaram os investimentos obrigando o governo, para evitar o pior, a se envenenar com a própria saliva: fazer exatamente o contrário do que vinha prometendo. Resultado: aumento dos juros, dos tributos, do cambio, e redução dos salários o que provoca recessão e desencadeia fortes focos inflacionários. A saída da enrascada é viável, mas muito penosa: recessão profunda misturada com inflação robusta penetrando nos dois dígitos. A avaliação do governo desce aos infernos. Se, eleitoralmente a política anterior garantiu a vitória em 2014 (por pouco, é verdade), o ajuste irá cobrar um preço muito alto nas eleições municipais de 2016, e nas presidenciais de 2018, sem falar que a estiagem não raciona água na operação Lava Jato.
E a saída? O próprio veneno cria antídotos, ou melhor, pré-condições para a volta do crescimento. As exportações estimuladas pelo cambio desvalorizado começam a se animar e apesar da crise na China (principal parceiro comercial) elas encolheram menos do que as importações produzindo um estimulante superávit comercial. O desemprego força os salários para baixo: custos reduzidos animam os exportadores e os empregadores em geral. Já vimos este filme, especialmente na crise de 1999 – 2001, mas ainda faltam duas condições sem as quais as quatro taxas do apocalipse (cambio, salários, tributos e juros) não produzem um alinhamento ótimo. A taxa de juros que não depende do legislativo, já se encontra quase ajustada. O obstáculo é o próprio partido do governo que opera contra seu aumento, e também bloqueia medidas de redução de custos como mudanças na idade mínima para as aposentadorias. Sim, eu sei que o aumento desta taxa é um bumerangue que retorna e devasta a dívida pública, mas é o preço a ser pago pela farra anterior. Ou melhor, as coisas vão piorar antes de melhorar. E o melhorar aqui é apenas uma possibilidade.
As dificuldades no ajuste da carga tributária – aprovação da CPMF p. ex.– apoiada pelo PT, mas rejeitada por grande parte do Congresso é talvez o maior obstáculo que, se não superado fará o déficit se agravar. Sem arrumar suas contas nada feito, e a volta dos investimentos do setor privado será adiada.
Um complicador de peso é o impasse político (Dilma x Cunha) com a ameaça de duplo “impeachment” que impede um mínimo de previsão, indispensável para a retomada da confiança dos investidores. O primeiro ano do novo mandato, 2015, foi praticamente perdido. Neste segundo, o problema parece que será resolvido embora a capacidade de procrastinação do Legislativo e do Executivo alcance dimensões cósmicas. Mesmo com a superação da crise política tudo indica que o PIB também encolherá significativamente em 2016. Nos dois últimos, só 2017 dá esperanças de que o econômico tem chance de não ser sacrificado em nome do eleitoral. Rezemos para que as dificuldades econômicas mundiais que se intensificam – com a China cambaleando – não agravem nossa situação e comprometam a retomada do crescimento, transformando este período na pior fase econômica dos últimos 100 anos.