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fev 23 2011

O Aquecimento Global: Chayanov Revisitado

Em 1920 Alexander Chayanov economista agrário russo publicou em Moscou uma novela que, anos mais tarde, lhe custaria a cabeça. A “Viagem de meu irmão Alexei ao país da utopia camponesa” escrita sob o pseudônimo de Ivan Kremnev cometia a heresia mortal de prever a conquista do poder, em 1934, pelo Partido Camponês em lugar do Partido Proletário ( Bolchevique), e sua consagração em 1984.

Durante 50 anos os camponeses no poder convencidos dos enormes perigos que as concentrações urbanas representavam para democracia eliminariam todas as cidades de mais de 20 mil habitantes.

Os camponeses dominariam a Rússia soviética auxiliados por poderosa ferramenta: o controle do clima. Eliminava-se um dos maiores problemas da agricultura – a incerteza – e os exércitos inimigos (leia-se, os temíveis alemães) que se cuidassem, pois poderiam ser desintegrados por um furacão bem direcionado pela artilharia do Exército Vermelho ( no caso Verde…). A segunda parte agradava a Stalin. Mas a primeira era intolerável e Chayanov foi fuzilado em 1935, acusado de liderar este imaginário e fantástico partido.

Passados mais de 80 anos o controle do clima ainda está muito longe de ser alcançado, se é que algum dia isso será possível. Mas a convicção que a ação humana pode alterá-lo de maneira catastrófica e irreversível ( já pensou no degelo polar?) ganha cada vez mais corações e mentes. Inclusive o das pessoas que contribuem para o efeito estufa.

O problema são os perigosos derivativos do aquecimento global: variações climáticas que devastam a agricultura e elevam o nível do mar. A subida das águas transformaria a bela capital de Pernambuco em enorme recife de concreto. Nova Orleans, Veneza e, especialmente Amsterdam, desapareceriam antes; Cuzco talvez resistisse até o final.

A Holanda, aliás, no início da primavera de 2007, passou pelo período de seca mais prolongado dos últimos 140 anos. Lá, falta d’água só não é mais grave do que a super abundancia. Suspeita-se que os holandeses tornaram-se o povo mais alto da Europa devido à ameaça de afogamento…

A grande diferença com o passado é que agora o “Polluter Pays Principle” torna-se imperativo: queira ou não o poluidor acaba pagando, embora a proporcionalidade nem sempre se aplique. É possível que as perdas decorrentes das mudanças climáticas globais já superem os custos de evitá-las.

E, nem sei se existem métodos solventes para o exercício desta contabilidade embora o protocolo de Kyoto traga algo nessa direção com os chamados Créditos de Carbono. Mas os povos, como as pessoas, aprendem menos pelos acordos e mais pela repetição ou pelo trauma. Ou melhor, pela repetição do trauma ou pelo trauma da repetição.

O Katryna que devastou Nova Orleans, as ondas de seca e calor na Europa, o derretimento de geleiras polares, a evaporação das neves do Kilimanjaro e os pequenos furacões na costa de Santa Catarina talvez sejam as repetições visíveis de traumas que acabem por convencer, enquanto é tempo, os mais recalcitrantes. O Plano B é ensinar, inclusive os que vivem no Nepal, a nobre arte da natação.

Artigo publicado na Revista RAE da EAESP-FGVSP www.rae.com.br