Em 15 de agosto de 1971 o então presidente Nixon desvalorizou o dólar. Denunciou a obrigação assumida pelos Estados Unidos em 1944, na aprazível Bretton Woods, de converter dólares em ouro à cotação fixa de 35 por onça troy. Esse ato, popularmente chamado de “fechamento da Janela de Ouro”, ocasionou o fim do sistema de conversibilidade (padrão câmbio-ouro), provocando, além de fortes convulsões inflacionárias, grande turbulência nos mercados financeiros internacionais durante toda a década. Os preços das commodities, especialmente o petróleo, dispararam. Dependente do produto, o Brasil sofreu fortes déficits comerciais e, para cobri-los, recorreu a robusto endividamento externo, cujas conseqüências são sentidas até hoje.
A gênese da desvalorização deveu-se aos déficits crescentes que os Estados Unidos praticaram durante todos os anos 1960 e 1970: corrida espacial e armamentista, guerra do Vietnã, baixas taxas de juros, e redução da poupança doméstica.
Nos anos 1990, o dólar, ao contrário, se fortaleceu. Durante o governo Clinton o déficit interno foi zerado e a economia norte-americana acusou um crescimento exuberante, embora o déficit externo continuasse crescendo. As moedas atreladas ao dólar – a nossa a partir de 1994, as das jaguatiricas asiáticas como a da Tailândia, e as das algemadas, como a da Argentina – valorizaram-se, trazendo inicialmente estabilidade de preços, mas acusaram fortes déficits comerciais no final da década.
O desfecho foram crises cambiais, inflação e recessão. No governo Bush, no entanto, o equilíbrio interno, que garantia a valorização do dólar, desapareceu. E o externo aumentou. Somados, estes déficits estão perto do trilhão. Os gastos com as guerras do Afeganistão e o Iraque somam mais de 1,5 trilhão de dólares. Lembram os déficits causados pela guerra do Vietnã.
A ameaça de agredir o Irã militarmente alavanca os preços do petróleo para além de 100 dólares o barril. A redução da prime rate para amenizar o drama dos sem-teto de classe média nos Estados Unidos e salvar o sistema financeiro acende a luz amarela entre os que possuem reservas em dólares, como os chineses. Recado: se a remuneração continuar caindo, a alternativa é diversificar o portfólio e debilitar ainda mais a moeda norte-americana.
No momento, o setor externo brasileiro está bem mais fortalecido. As reservas estão elevadas, o petróleo debaixo do sal é realmente nosso, e o superávit comercial continua considerável, mesmo com a valorização do real. O perigo é uma recessão nos Estados Unidos comprometer o crescimento mundial, abalar nosso setor externo e prejudicar o desempenho do PIB – logo agora quando nosso amigo parecia estar saindo da toca.
Artigo publicado na Revista RAE da EAESP-FGVSP www.rae.com.br