“Com as baionetas se pode fazer tudo menos sentar em cima delas”. A frase é atribuída a um famoso general francês que dizem morreu envenenado. O mesmo se aplica à taxa de juros: única arma rápida e eficiente contra a desaceleração da economia norteamericana mas que tem seus limites. Em janeiro de 2008 duas reducões somando 1,25% jogaram a Prime Rate para 3,0% dando a medida do problema. Para reforçar, o presidente Bush acenou com alguns cortes de impostos e introdução de subsídios pensando que dissiparia as incertezas mas foi como anunciar que o gladiador era um anão. Na Europa um espiroqueta do mercado financeiro foi descoberto provocando um descomunal rombo num dos maiores bancos franceses. As bolsas despencaram lembrando o refrão: quando sobem, sobem mais do que podem e quando caem, caem mais do que devem.
A pergunta è: até que ponto a Prime Rate deve encolher para estimular o consumo e o investimento produtivo neutralizando a crise originada nas hipotecas subprime e evitar a recessão? Seguida por uma outra: numa sociedade viciada em consumo a redução exagerada dos juros não provocaria um enfraquecimento do dólar a expansão da demanda e pressões inflacionárias indesejadas num ano eleitoral? Estariam os americanos imunes à armadilha da liquidez situação na qual a desconfiança no sistema financeiro e as incertezas sobre o descasamento entre o preço dos ativos financeiros e a taxa de juros leva os agentes a manter recursos monetários ociosos como ocorreu no Japão e o país desliza para a deflação combinada com estagnação? Creio que os americanos ainda deverão sofrer muitos traumas para passar da idolatria, à aversão ao consumo.
Em todo caso o mais provável é que este caia e os americanos tenham que conviver com a recessão, mas combinada com consideráveis pressões inflacionárias fenômeno típico dos anos 1970 e batizado como estagflação. É preciso lembrar também que a taxa de juros básica Americana caiu abaixo da taxa de juros do Banco Central Europeu enfraquecendo ainda mais o dólar frente ao euro. A rolagem do enorme endividamento americano não estaria em perigo? Ou haveria uma especie de armadilha para aqueles que aplicaram suas reservas em títulos do Tesouro Americano isto é em dólares e agora não podem sair como prudentemente fez a “über model” Gisele Bündchen cujos contratos utilizam exclusivamente o euro? E nós?
Bem hoje o Brasil parece estar melhor preparado para enfrentar a desaceleração da economia mundial. Um sintoma interessante é que em janeiro de 2008 a fuga de capitais especulativos que provocou a queda na Bovespa foi em grande medida compensada pela entrada de investimentos produtivos que se movem por considerações de médio e longo prazo. A blindagem das reservas parece razoavelmente sólida garantindo a estabilidade do cambio no curto prazo e por extensão segurando a inflação. A manutenção da taxa Selic no Brasil acima dos 11% é o único fator negativo que alimenta o crescimento da dívida interna e segura a onda expansiva dos investimentos e do consumo. O fato é que não aproveitamos a boa conjuntura internacional dos últimos 5 anos. Nosso expressivo crescimento em 2007 parece ter chegado no fim da festa. O PIB de 2008 talvez acuse os golpes da retração nos Estados Unidos e o sólido impulso de 2007 poderá em parte desmanchar-se no ar.
Artigo publicado na Revista RAE da EAESP-FGVSP www.rae.com.br