Trocado em miúdos, o Paradoxo de Allais, fruto da crítica de Maurice Allais ao livro Game Theory and Economic Behaviour de John von Neumann e Oskar Morgenstern, aponta para o seguinte: há preferência pela segurança na vizinhança da certeza se grandes somas de dinheiro estiverem em jogo. No popular: não se troca o certo pelo duvidoso, mesmo que o risco seja irrisório.
No caso do Paradoxo de Allais, isso se traduz na chamada quebra da invariância. Invariância significa: se a alternativa A é preferível à B, e a alternativa C preferível à D, então quem preferisse A também escolheria C. Maurice Allais mostrou, em um famoso teste dos anos 1950, que nem sempre isso ocorria: na vizinhança da certeza, os agentes preferiam a segurança, mesmo diante do risco irrelevante de uma escolha alternativa.
Ou seja, preferiam A à B, mas D à C. Quando, inspirado em Allais, coloco meu gorro de economista experimental, faço o seguinte teste para estimar a propensão ao risco:
a) certeza de ganhar 5 milhões de reais;
b) 99% de probabilidade de ganhar 7 milhões e 1% de probabilidade de não ganhar nada. Embora o risco em b seja irrisório (um em cem) e o ganho considerável (40% a mais), grande parte dos presentes opta pela primeira alternativa.
Em seguida, repito várias vezes outro teste: retirar uma bolinha vermelha no meio de 99 azuis. Até agora, a vermelha não saiu. O curioso é que, mesmo depois desta demonstração, aqueles que optaram pelos 5 milhões permanecem na mesma atitude. Como agiriam nossas autoridades monetárias se fossem submetidas a esses testes? Com certeza, optariam pela turma dos 5 milhões.
Quebrariam também a invariância? Muito provavelmente: se a situação A (juros caindo lentamente) for preferível à B (juros caindo velozmente), e a situação C (o PIB crescendo “aceleradamente”) for preferível à D (o PIB crescendo lentamente), então, se A melhor que B, C deveria ser melhor do que D. Mas, no governo, a escolha acaba sendo D, e não C… E que ninguém se espante pelo fato de que, mesmo inflado no “tapetão”, o crescimento do PIB brasileiro ainda não tenha alcançado o dos países emergentes.
A preocupação real do governo (suspeita-se) é a inflação e não o PIB. Seus dirigentes parecem acreditar na Teoria do Caos – uma leve queda nos juros em Brasília provocaria furacões inflacionários na Vila do Cafufo. Na Vila, até os economistas sabem que o santo padroeiro é o câmbio, e não os juros.
Resta então o temor de não conseguir a rolagem da dívida pública. Se a taxa Selic caísse mais velozmente, os investidores financeiros abandonariam o certo (títulos públicos) pelo duvidoso (renda variável ou consumo), causando a expansão da base monetária e inflação? Não creio, pois dentro de limites ainda muito distantes, os investidores financeiros têm a mesma preferência pela segurança que seus compatriotas do Banco Central.
Artigo publicado na Revista RAE da EAESP-FGVSP www.rae.com.br