fev 12 2009

Moral Hazard

Dicionário de Economia do Século XXI.

Expressão em inglês cuja tradução literal é “Risco Moral”, mas que na prática dos mercados financeiros significa excesso de confiança por parte dos agentes financeiros de que o Banco Central de um país sairá em seu socorro em situação de crise ou dificuldades de honrar compromissos. Essa credulidade excessiva pode resultar em perdas na medida em que as estimativas de evolução do mercado podem ser superestimadas.

Em outras palavras, o aumento do grau de segurança no qual um agente acredita operar pode levá-lo a agir de forma mais ousada e temerária, colocando em risco a estabilidade de todo um sistema financeiro. Do ponto de vista de uma empresa de seguros, moral hazard significa a influên¬cia adversa que o seguro provoca no comportamento de um segurado.

Por exemplo, uma pessoa que tenha um seguro contra incêndio pode ser negligente em tomar medidas de precaução contra o fogo ou no limite atear fogo na casa para receber o seguro. Em economia, essa expressão foi cunhada por Kenneth Arrow em seu livro Essay in the Theory of Risk-bearing (Ensaio sobre a Teoria de Assumir Riscos), 1971.

Veja também: Arrow, Kenneth; Risco

jan 01 2009

A Crise Econômica e o Beija-Flor

Em visita ao Brasil, Aldous Huxley, admirado, dizia que o beija-flor se apoiava na própria vibração. Se comparecesse à Bolsa de Valores poderia ter a mesma ilusão. Os mercados financeiros também vibram, é certo. Mas, ao contrário dos  pássaros, às vezes perdem o apoio e desmoronam sem piedade. O néctar seca e os vibrantes vôos dos investidores, que eram sólidos, se dissolvem no ar. Assustadas, as flores se fecham. O crédito some. A crise se instala tendo início o salve-se quem puder.

Na realidade, à diferença da natureza que (se o homem não atrapalhar) reencontra seu equilíbrio, os mercados necessitam forças externas para recuperar o animo. Deixados em completa liberdade tendem a crescer mais do que podem – quando se expandem – e a cair mais (e põe mais nisso…) do que devem quando descem a rampa. Especialmente se a regulamentação e a fiscalização afrouxarem, tipo: deixem os especuladores trabalhar…! Para sair da crise a terapia é (ou era) conhecida: juros reduzidos, a liquidez e investimentos públicos ampliados para gerar empregos, e impostos encolhidos. Políticas monetaristas e keynesianas, abandonam antiga rivalidade e se entrelaçam num abraço amoroso ( de afogados?). Especialistas provavelmente chamados Milton Keynes ou  John Maynard Friedman tornam-se assessores de Barak Obama.

Mas algo não esta funcionando. Ou melhor, há algo novo nessa crise. É como se uma mutação no vírus que a provoca neutralizasse todas as terapias disponíveis, e o organismo continuasse piorando. Será que o crescimento da economia global foi tão acelerado nos últimos anos e agora, na queda, exija doses muito mais fortes destes remédios? Mas o que fazer se a taxa de juros já é praticamente zero (lá, einh!) ou mesmo negativa? Será necessário construir réplicas em tamanho natural das pirâmides egípcias (não as do tipo Madoff-Ponzi é claro) no deserto do Arizona para criar demanda efetiva? Há escassez de poupança ou a falta de financiamento resulta da ausência de confiança? A poupança global não teria se distribuído numa perigosa assimetria: negativa nos Estados Unidos e transbordando nos quase 2 trilhões de dólares das reservas chinesas?

Para retomar os investimentos as empresas deverão primeiro quebrar para depois num processo de destruição criativa schumpteriana se reerguer sobre novas bases como é o caso da indústria automobilística?

São interrogantes que talvez exijam mais tempo para serem respondidas. Mas se não forem, só nos restará dizer: 33!

nov 24 2008

O Combate à Inflação: Juros ou Cambio?

O setor público pagou cerca de 106 bilhões de reais de juros por suas dívidas no primeiro semestre de 2008. O desembolso foi superior, descontada a inflação, ao pago em 2007. O resultado já era esperado, pois o montante da dívida cresceu e os juros incidentes sobre ela voltaram a subir. O governo alega que é necessário aumentar os juros para conter a inflação. Quebra os ovos do dragão inflacionário inibindo o consumo. Mas este não para de crescer. Os vendedores já aprenderam a embutir os juros nas prestações e alongar os prazos de pagamento.

O cliente não olha os juros e sim verifica se a prestação cabe no seu orçamento mensal” afirmam com temerária esperteza, e la nave va. O perigo é a criação de uma bolha financeira a ser estourada pela lança da inadimplência. Mas se isso ocorrer no futuro… tudo bem, pois o futuro ainda está longe. Como diria Vinicius de Moraes: que não seja eterna posto que é bolha, mas que as vendas sejam máximas enquanto dure… Em síntese, a elevação da taxa de juros não tem alcançado seu propósito e, o efeito colateral – comprometer maior receita pública para pagar juros – impede que a arrecadação crescente seja utilizada em benefício da população: melhoria dos serviços reforma da infra-estrutura e investimentos para azeitar o crescimento do PIB.

A queda do ritmo inflacionário observada nos últimos meses não se deveu ao aumento da taxa de juros. Mas sim a uma combinação de término da entre safra de grãos, queda nas cotações das commodities e redução da especulação com os preços do petróleo. Se o governo quiser conter o crédito a arma mais eficaz é o aumento do depósito compulsório. Este sim é capaz de bloquear a capacidade do setor financeiro em expandir o volume de crédito.

Na verdade, no caso brasileiro, quem segura a inflação em patamares baixos é a taxa de cambio. Mas esta começa a dar sinais de inquietação, pois o saldo da balança comercial se reduziu fortemente. Além disso, parte dos investimentos especulativos que animaram as Bolsas de Valores no primeiro semestre (e que inflavam a oferta interna de dólares) estão voltando para salvar posições comprometidas nos cambaleantes mercados financeiros do exterior.

Se o cambio prosseguir se desvalorizando, abandonando o nível confortável em que ainda se encontra, então sim assistiremos a pressões inflacionarias vigorosas. Nesse caso será inevitável uma forte elevação dos juros para derrubar o crescimento do Pib em direção a patamares inferiores a 3%.

A conjuntura internacional favorável vivida até 2006 parece estar sendo corroída por um grau elevado de incerteza. Grandes instituições financeiras beijam a lona e mesmo uma das maiores montadoras mundiais apresentou contas de um vermelho alarmante.

A obsessiva luta contra a inflação travada a partir de 2003 deixou escapar o bom momento internacional para crescer de forma mais consistente. É verdade que o PIB está se expandindo em 2008. Mas, em parte isso se deve ao forte impulso de 2007. É também certo que as eleições deste ano motivam o governo a gastar mais: a mãe do PAC não por acaso é a candidata do governo às eleições presidenciais de 2010. Penhorada, a demanda efetiva agradece. Mas talvez isso seja muito pouco para garantir a continuidade do crescimento em 2009.

Artigo publicado na Revista RAE da EAESP-FGVSP www.rae.com.br

nov 01 2008

Sobre Pães e Idéias na Economia

Adam Smith acreditava que o ser humano possuia uma tendência natural a trocar e a permutar. Se duas pessoas trocassem pães cada uma voltaria para casa com um deles: uma troca de equivalentes. No caso de idéias, esta regra não necessariamente valia, pois cada um poderia retornar com ambas. O pai da economia, no entanto, era alheio aos jogos tipo “ganha-ganha”.

E também à antropofágica certeza de que uma invariavelmente devoraria a outra. Smith, é verdade, combateu mercantilistas e fisiocratas: ao comércio ou à agricultura contrapunha o trabalho – e sua divisão- como a fonte da riqueza de uma nação. Esta idéia revolucionária, que desembocava na liberdade dos mercados e rechaçava a intervenção estatal, não surgiu numa fábrica de alfinetes.

Já existia na sociedade empurrada por ousados capitães de fábricas, que arrebentavam os grilhões do feudalismo em decadência. Mas, quando o capitalismo entrou em crise, estas idéias também foram atropeladas. Clamava-se pela intervenção estatal e Keynes trouxe a legitimidade necessária em nome da salvação do sistema: a água era suja, mas apagava o incêndio.

Os governos capitalistas se acostumaram a gastar para criar demanda efetiva e evitar o ciclo no contra-pé. Por um tempo, deu certo. Os países socialistas no entanto ainda permaneciam como alternativa: distribuiam bem o que produziam mal. Neles a mercadoria deixava de existir: a troca era transformada em simples distribuição. Mas surgia uma pergunta corrosiva: para que produzir valores de uso, isto é, coisas úteis se não era necessário confirmá-las na troca?.

A qualidade dos produtos e a inovação tecnológica eram imoladas em nome do igualitarismo. Na outra ponta, os produtos capitalistas tornavam-se imbatíveis e sedutores. As telecomunicações se encarregaram de mostrar a diferença e a idéia de economia centralmente planejada, agonizou.

O capitalismo estava livre para a vingança neoliberal: se o estado asfixiava, que o mesmo fosse enforcado. A idéia do estado mínimo e barato deu volta ao mundo em menos de 80 dias desembarcando em Washington, terra do consenso. O esperanto economico se esparramou, anunciando que o estado tornara-se um mal desnecessário. Mas em estado puro, sabemos, o mercado é instável, turbulento, volátil e cruel. E pior, imprevisível.

Como evitar tais males? Um pitada de intervenção regulatória ( e punitiva) não faria mal a ninguém, nem uma rede para amparar os excluídos. Mas sem exageros… E o futuro? Bem este poderá ser melhor antecipado por um mergulho no interior do cérebro humano: quais os neurônios responsáveis pela tomada de decisões? Nossa sorte está entregue aos economistas que hoje desenvolvem novas idéias nos campos da psicologia e da neurologia.

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nov 01 2008

Neuroeconomics: A admirável nova economia

“Tudo sugere a existência de um certo ponto da mente no qual vida e morte, real e imaginário, passado e futuro, o comunicável e o incomunicável, as alturas e a profundidade, deixam de ser percebidos como contraditórios.Ora, seria em vão que se buscaria qualquer outro motivo para a atividade surrealista a não ser a esperança de determinar este ponto”
(André Breton, Deuxiéme Manifeste du Surréalisme, Paris 1930)

Um sujeito tenta tomar um avião com uma bomba. É preso pela polícia. Interrogado, diz o seguinte: “Era obrigado a viajar muito de avião e temia que alguém colocasse uma bomba num deles. Consultou um especialista em probabilidades, e este lhe disse que o risco era ínfimo: mas suficiente para deixá-lo muito angustiado.

Assim, ele não pisava mais num avião a não ser com uma bomba debaixo do braço pois segundo o especialista, a probabilidade de duas bombas num mesmo avião, era praticamente zero; e isto satisfazia suas exigências de segurança”.

Os policiais consideraram a resposta consistente e muito convincente, e soltaram o preso.

Esta pequena estória adaptada de John Allen Paulos, que se passa evidentemente nos Estados Unidos, ilustra um campo de análise novo em economia, no qual os psicólogos se sentem à vontade e que consiste em identificar comportamentos que diferem de um modelo padrão, para criar novos padrões – com o perdão da incongruência – atípicos…ou não-mercado.

Economia experimental ou “neuroeconomics”, a primeira, espécie de caixa de ferramentas da segunda, já produziu dois Prêmio Nobel em Economia: Daniel Kahneman e Vernon Smith. Bem qual é o objetivo dessa nova abordagem?

Na Era da Incerteza é ter melhores meios de realizar a espinhosa tarefa das previsões. Se os meandros do cérebro que levam as pessoas a tomar decisões ( econômicas) forem conhecidos, as incertezas poderão ser reduzidas. Bastaria ligar uns fios…

A meteorologia melhorou seus vaticínios depois da rede de satélites que hoje coalham a abóbada celeste e saturam os computadores com informações. Da mesma forma , as previsões econômicas, com estas novas abordagens e com o auxílio de supercomputadores, podem alcançar maior grau de precisão evitando uma série de efeitos colaterais entre os quais o desperdício e especialmente as crises financeiras que tanto tem prejudicado a economia mundial e especialmente a brasileira.

Alguém já disse que a incerteza é o que os outros vão fazer. Se estes processos puderem ser mapeados com um razoável grau de precisão as estratégias do tipo ganha-ganha serão muito mais freqüentes, para o bem do povo e felicidade geral do leão.

O grande problema é a assimetria na apropriação destas informações. Se tais conhecimentos não se distribuírem democraticamente, a possibilidade de manipulação poderá tornar-se mais uma ferramenta para oprimir corações e mentes. Caso este conhecimento seja distribuído generosamente, como um italiano jogando queijo sobre o próprio macarrão, o mundo será melhor servido. Lamentavelmente a economia perderia muito das fortes emoções que hoje nos proporciona.

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out 24 2008

A Bolha Imobiliária e o Risco Moral

Moral Hazard, expressão cunhada por Kenneth Arrow em seu livro Essay in the Theory of Risk-bearing, pode ser traduzida por “risco moral”. Significa excesso de confiança dos agentes econômicos de que alguém os socorrerá se alguma coisa der errado em suas operações. Em termos mais concretos: o Banco Central providenciará uma rede de proteção se ocorrerem grandes perdas decorrentes de uma avaliação errônea dos riscos apresentados por determinado mercado, especialmente o financeiro.

Na prática, significa maior propensão ao risco, ou melhor, comportamento ousado e temerário, o que pode colocar em grande perigo a estabilidade de uma economia.
Os estragos do moral hazard são especialmente elevados no mercado financeiro, pois a diversificada articulação das várias formas de investimento num mundo globalizado significa que perdas em um ponto podem se espalhar com grande rapidez por toda a rede. Basta que, em determinada Bolsa de Valores, uma destas articulações se rompa, especialmente se for um importante entroncamento financeiro, para que todo o restante desmorone.

Quando a taxa de juros é baixa, a inclinação por operações arriscadas aumenta ainda mais. Foi o que ocorreu nos Estados Unidos depois dos atentados de 11 de setembro, quando, para neutralizar as incertezas que ameaçavam desacelerar a economia, o dr. Alan Greenspan cortou os juros drasticamente. Durante três ou quatro anos, a prime rate parecia ter nascido no Japão.

Porém, nem todos os tomadores de empréstimos tinham a solvência necessária para desfrutar do clube da prime rate. Para estes, a saída, ou melhor a entrada, era o sub-prime: taxas de juros mais elevadas (embora baixas) compensavam o risco (maior) de inadimplência. Mas, quando as taxas começaram a subir entre 2005 e 2007 as coisas se complicaram especialmente nos financiamentos de longo prazo como é o caso do mercado de hipotecas.

O problema é que os títulos de dívida sub-prime, respaldados, diga-se de passagem, por importantes agencias de rating, passavam de mão em mão como se fossem blue-chips. Muitos destes créditos receberam a classificação de AAA, quando deveriam ter no máximo um há! há! há! O desastre da inadimplência anunciado desde 2006 afetou duramente as bolsas norte-americanas entre julho e agosto de 2007 e se espalhou por todo o mundo obrigando os Bancos Centrais dos países ricos a injetar dinheiro no mercado a um custo mais baixo para evitar uma crise financeira geral.

A crise foi contornada, mas a contaminação do setor produtivo tornou-se inevitável.
A recessão bateu à porta da classe média e, para evitar o pouso forçado o Banco Central (Fed ), reduziu a prime-rate de uma só tacada em 0,5%. O moral hazard funcionou, evitou-se o pior, mas muita gente vai sair machucada, e sem um teto para curar as feridas. Para esta gente o Presidente Bush já está prometendo uma rede de proteção pois as eleições se aproximam e ninguém é de ferro.

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set 01 2008

O paradoxo de Allais e a Selic

Trocado em miúdos, o Paradoxo de Allais, fruto da crítica de Maurice Allais ao livro Game Theory and Economic Behaviour de John von Neumann e Oskar Morgenstern, aponta para o seguinte: há preferência pela segurança na vizinhança da certeza se grandes somas de dinheiro estiverem em jogo. No popular: não se troca o certo pelo duvidoso, mesmo que o risco seja irrisório.

No caso do Paradoxo de Allais, isso se traduz na chamada quebra da invariância. Invariância significa: se a alternativa A é preferível à B, e a alternativa C preferível à D, então quem preferisse A também escolheria C. Maurice Allais mostrou, em um famoso teste dos anos 1950, que nem sempre isso ocorria: na vizinhança da certeza, os agentes preferiam a segurança, mesmo diante do risco irrelevante de uma escolha alternativa.

Ou seja, preferiam A à B, mas D à C. Quando, inspirado em Allais, coloco meu gorro de economista experimental, faço o seguinte teste para estimar a propensão ao risco:

a) certeza de ganhar 5 milhões de reais;

b) 99% de probabilidade de ganhar 7 milhões e 1% de probabilidade de não ganhar nada. Embora o risco em b seja irrisório (um em cem) e o ganho considerável (40% a mais), grande parte dos presentes opta pela primeira alternativa.

Em seguida, repito várias vezes outro teste: retirar uma bolinha vermelha no meio de 99 azuis. Até agora, a vermelha não saiu. O curioso é que, mesmo depois desta demonstração, aqueles que optaram pelos 5 milhões permanecem na mesma atitude. Como agiriam nossas autoridades monetárias se fossem submetidas a esses testes? Com certeza, optariam pela turma dos 5 milhões.

Quebrariam também a invariância? Muito provavelmente: se a situação A (juros caindo lentamente) for preferível à B (juros caindo velozmente), e a situação C (o PIB crescendo “aceleradamente”) for preferível à D (o PIB crescendo lentamente), então, se A melhor que B, C deveria ser melhor do que D. Mas, no governo, a escolha acaba sendo D, e não C… E que ninguém se espante pelo fato de que, mesmo inflado no “tapetão”, o crescimento do PIB brasileiro ainda não tenha alcançado o dos países emergentes.

A preocupação real do governo (suspeita-se) é a inflação e não o PIB. Seus dirigentes parecem acreditar na Teoria do Caos – uma leve queda nos juros em Brasília provocaria furacões inflacionários na Vila do Cafufo. Na Vila, até os economistas sabem que o santo padroeiro é o câmbio, e não os juros.

Resta então o temor de não conseguir a rolagem da dívida pública. Se a taxa Selic caísse mais velozmente, os investidores financeiros abandonariam o certo (títulos públicos) pelo duvidoso (renda variável ou consumo), causando a expansão da base monetária e inflação? Não creio, pois dentro de limites ainda muito distantes, os investidores financeiros têm a mesma preferência pela segurança que seus compatriotas do Banco Central.

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ago 01 2008

O Dólar e a Janela de Ouro

Em 15 de agosto de 1971 o então presidente Nixon desvalorizou o dólar. Denunciou a obrigação assumida pelos Estados Unidos em 1944, na aprazível Bretton Woods, de converter dólares em ouro à cotação fixa de 35 por onça troy. Esse ato, popularmente chamado de “fechamento da Janela de Ouro”, ocasionou o fim do sistema de conversibilidade (padrão câmbio-ouro), provocando, além de fortes convulsões inflacionárias, grande turbulência nos mercados financeiros internacionais durante toda a década. Os preços das commodities, especialmente o petróleo, dispararam. Dependente do produto, o Brasil sofreu fortes déficits comerciais e, para cobri-los, recorreu a robusto endividamento externo, cujas conseqüências são sentidas até hoje.

A gênese da desvalorização deveu-se aos déficits crescentes que os Estados Unidos praticaram durante todos os anos 1960 e 1970: corrida espacial e armamentista, guerra do Vietnã, baixas taxas de juros, e redução da poupança doméstica.

Nos anos 1990, o dólar, ao contrário, se fortaleceu. Durante o governo Clinton o déficit interno foi zerado e a economia norte-americana acusou um crescimento exuberante, embora o déficit externo continuasse crescendo. As moedas atreladas ao dólar – a nossa a partir de 1994, as das jaguatiricas asiáticas como a da Tailândia, e as das algemadas, como a da Argentina – valorizaram-se, trazendo inicialmente estabilidade de preços, mas acusaram fortes déficits comerciais no final da década.

O desfecho foram crises cambiais, inflação e recessão. No governo Bush, no entanto, o equilíbrio interno, que garantia a valorização do dólar, desapareceu. E o externo aumentou. Somados, estes déficits estão perto do trilhão. Os gastos com as guerras do Afeganistão e o Iraque somam mais de 1,5 trilhão de dólares. Lembram os déficits causados pela guerra do Vietnã.

A ameaça de agredir o Irã militarmente alavanca os preços do petróleo para além de 100 dólares o barril. A redução da prime rate para amenizar o drama dos sem-teto de classe média nos Estados Unidos e salvar o sistema financeiro acende a luz amarela entre os que possuem reservas em dólares, como os chineses. Recado: se a remuneração continuar caindo, a alternativa é diversificar o portfólio e debilitar ainda mais a moeda norte-americana.

No momento, o setor externo brasileiro está bem mais fortalecido. As reservas estão elevadas, o petróleo debaixo do sal é realmente nosso, e o superávit comercial continua considerável, mesmo com a valorização do real. O perigo é uma recessão nos Estados Unidos comprometer o crescimento mundial, abalar nosso setor externo e prejudicar o desempenho do PIB – logo agora quando nosso amigo parecia estar saindo da toca.

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jul 01 2008

Previsões: Meteorológicas ou Econômicas?

Previsões econômicas e meteorológicas, no passado, tinham algo em comum: ambas eram alvo de chacotas ou ácidas ironias, pois raramente acertavam. De uns tempos para cá as meteorológicas melhoraram bastante. As econômicas deixam cada vez mais a desejar.

Há uma diferença crucial entre os dois campos do conhecimento: as mutações na natureza – exceto as microbianas – são lentíssimas; na economia podem ocorrer com a velocidade da luz pois estão sujeitas à teclas de computador e alguma coisa que se poderia chamar de vontade. Especialmente a vontade de esconder e de ocultar. Ou de enganar.

Não é porque Kepler descobriu as leis do movimento dos planetas que o Criador teria exclamado: “Ah! Este espertinho matou a charada. Vamos agora colocar a Terra girando entre Marte e Júpiter!”.

Na economia, no entanto, onde o ganhar ou perder depende em grande medida da arte de iludir, as previsões podem falhar e gerar grandes crises. As organizações esperam até o último minuto para revelar suas falcatruas. O que se pensava sólido transforma-se num pântano que devora as mais realistas ilusões.

Foi o que aconteceu em março de 2008 com o Bear Sterns quinto maior conglomerado financeiro dos Estados Unidos arrematado pelo JP Morgan por um pires de lentilhas com a benção da Reserva Federal.

Robert Shiller, economista norte-americano diz que se o preço de um título financeiro incorporar toda a informação necessária, as oscilações de suas cotações serão mínimas.

E as crises financeiras idem, idem. O problema reside em definir “toda a informação necessária”, pois ninguém sabe quais são seus limites. Além disso, é preciso avaliar se a informação é verdadeira ou não. Melhor, se não foi divulgada para enganar ou induzir o interlocutor a erro.

Dispositivos como a lei Sarbanes-Oxley (voltada para coibir irregularidades ou fraudes contábeis) e instrumentos como o Balanced Score Card (destinados a produzir indicadores mais consistentes) ajudam a dar mais transparência aos negócios mas são claramente insuficientes.

Será que o trauma de uma nova crise internacional levará as autoridades monetárias

(especialmente dos Estados Unidos) a começar a zelar pela qualidade dos títulos emitidos no mercado para coibir práticas de alavancagem financeira, que embora legais, como as hipotecas subprime, empurram o mundo para o limiar de um abismo?

Artigo publicado na Revista RAE da EAESP-FGVSP www.rae.com.br

maio 28 2008

Hipótese do Ciclo de Vida

Hipótese de que os indivíduos (famílias) consomem uma parte constante do valor presente de sua renda, durante seu tempo de vida, em cada período desta. Esta proporção dependerá dos gastos e preferências de cada consumidor, mas na medida em que a distribuição da população por idade e renda é mais ou menos constante, estas funções individuais de consumo podem ser agregadas para formar uma função de consumo agregada.

De acordo com essa hipótese, uma amostra aleatória de domicílios segundo nível de renda apresentaria um número desproporcionalmente grande de pessoas de meia-idade na faixa superior dos níveis de renda, e um número desproporcionalmente grande de jovens e idosos na faixa inferior. Domicílios “jovens” e “idosos” têm uma elevada propensão a consumir, ou rendimentos presentes, ou poupanças. Os domicílios jovens tomam empréstimos para consumir no presente e pagar com renda futura, e os domicílios idosos consomem suas poupanças acumuladas no passado.

Em contraste, os domicílios de “meia-idade” ou estão pagando suas dívidas contraídas anteriormente, ou estão poupando para a velhice, e, portanto, têm uma baixa propensão média a consumir. Conseqüentemente, os domicílios de baixa renda possuem uma propensão média a consumir muito elevada, acontecendo o contrário com os de renda elevada. Uma vez que as rendas do trabalho (salários) primeiro aumentam e depois diminuem, nesta trajetória de longo prazo, a propensão média a consumir variará inversamente em relação à renda, no transcorrer do ciclo econômico, como sugerido pela função consumo de curto prazo.

Dicionário de Economia do Século XXI.

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